De uns tempos pra cá venho experimentando uma sensação que até então julgava impossível: me sinto sozinho enquanto consumidor dos produtos Microsoft. Muito sozinho.
Meu celular é um Nokia Lumia, o notebook mais usado um Dell com Windows 8, meu video game é um XBox, a IDE mais fantástica que conheço é o Visual Studio (apesar do meu negócio ser a JVM), acho .net incrível, comprei o Office 2013 assim que saiu. Adoro todos estes produtos especialmente meu Nokia. Este post é o de um consumidor frustrado. E claro que uma mera sensação não iria justificar um post não é mesmo?
Meu celular metafórico
Quando fui trocar de aparelho havia três opções para um cara como eu que até então odiava este negócio: Galaxy S3, iPhone 4S e uma novidade chamada Nokia Lumia 800. Coloquei um ao lado do outro e imediatamente o Nokia venceu a competição: era tão diferente, de tão bom gosto: moderno no sentido literal da palavra.
Originalmente a palavra modernidade significa aquilo que quebra com a tradição. No caso do Lumia era óbvio: o Android me lembrava tanto o iPhone que dava aflição. Mesmo rodando o Windows Phone 7.8 e não o 8 que saiu poucos meses após minha compra e era incompatível com meu aparelho continuo muito satisfeito com minha escolha. Gosto tanto dele que sequer ligo pra isto: ele me atende em práticamente todos os sentidos, menos um: não há aplicações boas para ele (há raras, provávelmente bem menos que 30).
Não há aplicações boas para coisas básicas, como taxi, jogos, mesmo redes sociais. E quando navego pela app store fico chocado ao ver a qualidade porca da esmagadora maioria do que há disponível. Mesmo pagos, há raríssimas coisas que realmente valham à pena: até hoje não comprei nada (curiosamente, eu comprava para meus antigos Nokias com Symbian(sempre tinha um joguinho massa)).
O celular virou uma metáfora: um aparelho lindo e sozinho para o qual aparentemente ninguém quer desenvolver. As pessoas não ligam.
Vácuo na mídia
Qual foi a última aplicação for Windows (mobile ou desktop) que você viu fazer sucesso por aí e aparecer em massa na mídia nos últimos três ou quatro anos (jogos não valem)? Vemos inúmeras matérais sobre aplicações como Instagram (que não tem para plataforma Windows e que a Nokia literalmente implora por um port), Angry Birds (que até bem pouco tempo atrás só tinha uma versão paga para Windows Phone), WhatsUp (cuja versão para Windows Phone é um LIXO) e basicamente aplicações móveis apenas: é um fato, computação hoje é móvel.
Como uma empresa que rende bilhões de dolares por ano e com um imenso departamento de marketing pode aparecer tão pouco na mídia? Será possível que toda a imprensa foi comprada pela concorrência? Creio que não. Percebi que a coisa estava ficando realmente feia quando um dos mais populares sites que publicavam notícais sobre a Microsoft saiu do ar, o Microsoft Watch da Mary Jo Foley. Ainda há matérias sobre produtos da Microsoft: mas basicamente sobre X-Box e ferramentas de desenvolvimento presentes na mídia especializada apenas. Não há mais hype.
Produtos lindos que aparentemente ninguém quer
Quando o Surface foi lançado fiquei de queixo caído. Aliás, eu ainda babo em cima do produto que, ao menos pra mim, é bastante superior a todos os outros tablets (talvez nem seja um tablet). Seria minha “máquina de escrever” ideal. É um produto massa que trás consigo um conceito diferente do que vimos até então: cópias do iPad. E aí na contabilidade da Microsoft este ano aparece uma conta de 900 milhões de dolares em estoque de Surfaces RT que simplesmente não foram vendidos. Ei: a Apple também tem uma versão especial do Mac OS X para os dispositivos mobile (vulgo iOS), então a estratégia da Microsoft com o RT não é tão extravagante como parece. Mas no caso da Microsoft, ninguém compra.
O Windows 8 apesar de bem diferente do 7 é um sistema operacional bem legal: podem me chamar de louco mas é o meu favorito atualmente. Fácil de usar, rápido, responsivo e muito estável. Pessoas com pouca experiência podem usá-lo fácilmente pois lembra muito um tablet (talvez este seja o erro). E as pessoas não compram.
A App Store para Windows 8 é outro deserto: raríssimas aplicações de qualidade. Ontem precisei de um cronômetro para meus exercícios físicos: pensei em buscar um na loja virtual da Microsoft. Terminei usando uma versão em browser pois não encontrei nada que prestasse para uma função básica. É fato: se não há apps é porque não há mercado. As pessoas simplesmente não estão comprando.
Eu sei que o mundo mudou
É óbvio que hoje vivemos no mundo pós-PC. Uso mais meus tablets e celular que o notebook, que serve basicamente para escrever e programar. Claro que a Microsoft iria levar uma porrada bruta com esta nova fase vindo pra cima de nós: dizem por exemplo que em 2017 já vai estar irrelevante. Discordo: como usuário dos seus produtos os vejo irrelevantes hoje. Meus amigos (não técnicos) sequer sabem que estes existem (com exceção do X-Box). Anos atrás todos saberiam a respeito: lembram quando Windows CE dominava e Windows era sinônimo de computador? Hoje nas faculdades vemos a proliferação de iPads, MacBooks, aparelhos Android e cada vez menos Windows.
Quando o Windows 95 saiu foi revolucionário: mudou a maneira como víamos o desktop. Hoje vemos um Windows 8 que é igualmente revolucionário mas que ninguém liga. Ninguém nota, poucos comentam meses após o lançamento. De que modos a plataforma Microsoft está sacudindo o mundo hoje? Talvez nos videogames, mas repararam o fiasco que está sendo o pré-lançamento do X-Box One (que provávelmente vou comprar)?
É o fim?
Com certeza daqui a 50 anos ainda teremos sistemas sendo executados na plataforma Windows. É uma massa gigantesca demais para sumir do dia pra noite (provávelmente em uma variante do Azure). Não, a Microsoft não vai quebrar, ela inclusive vai muito bem financeiramente, obrigado.
A diferença é que hoje ao menos aparentemente ninguém mais liga.
PS: poderiam dizer que é só “modinha”. Mas sabem porque não é? Por que eu nem vejo mais o pessoal falar mal dos caras!
PS 2: cinco anos atrás fundei o Grails Brasil porque ninguém conhecia no país. Será que vão acabar criando um “Microsoft Brasil” para usuários como eu? :)
PS 3: Não sei por que me surpreendo, pois me avisei isto em 2008, lembra?
PS 4: Caramba, a itexto em um dado momento no passado (idos de 1999, 2001) quase se chamou “Kicosoft”, a influência era monstruosa.
“Com certeza daqui a 50 anos ainda teremos sistemas sendo executados na plataforma Windows. É uma massa gigantesca demais para sumir do dia pra noite” – há projectos que vão sendo desenvolvidos como ReactOS ou Mono, para onde progressivamente os desenvolvedores e utilizadores poderiam ir migrando enquanto não conseguem migrar para outros sistemas operativos ou tecnologias, como GNU/Linux, Python, etc., principalmente se levarmos em conta que uma enorme parte de desenvolvedores em VisualStudio são na verdade desenvolvedores em SQL que podem adaptar-se facilmente para outras tecnologias, e uma enorme parte dos utilizadores estão na verdade muito menos agarrados ou dependentes do Windows do que se supunha há algum tempo – se enquanto há 10 anos os utilizadores de IE eram mais de 95% e actualmente não passam dos 45%, o mesmo se aplicaria a todo o resto relacionado com Microsoft – e cada vez mais pessoas começam a ter noção de que enquanto as tecnologias proprietárias podem desaparecer da noite para o dia, as de software livre vieram para ficar
Bem lembrado Paulo: havia me esquecido do ReactOS. Ainda é desenvolvido, por falar nisto?
Lembro que era muito massa.
Me sinto da mesma forma que você.
Utilizo um Nokia Lumia 620 que atende perfeitamente minhas necessidades, mas acho muito porca a qualidade dos apps oferecidos na Store. Isso que pagamos por eles.
Tenho um Xbox+Kinect e acho sensacional.
Mas me sinto meio frustrada também!!
Teu post está excelente.
Oi Marília, que bom que não estou absolutamente sozinho! :)
Obrigado.
Passei este último ano estudando nos EUA e parte do que vi aqui foi o oposto do descrito.
Vi propagandas do surface e do lumia com windows 8 em onibus, paradas de onibus, tv, etc. Vi abrir um estande da MS num shopping e áreas destinadas a esses produtos em lojas de operadoras. Bom isso foi ano passado… neste ano, os aparelhos com windows 8 já estavam misturados com os outros e observei menos propagandas.
Os servidores de email da universidade em que fiquei passaram do servidor interno deles para o Office 365.
Conheci pessoas que haviam abandonado o IE e que estavam voltando ao IE10.
Vi mais pessoas interessadas em estágio na Microsoft do que na Google na universidade onde eu estava (talvez porque a Microsoft parecia mais interessada em contratar estagiários e participava de toda Career Fair, enquanto a Google foi uma vez no final do ano passado)
Conheci programadores que usam IE7/8 normalmente D:
Isso sem contar que a maioria das empresas que vendem notebook novo aconselham Windows 8 e muitos não tem nem suporte pra linux (como o Asus Taichi 21, que comprei =/ ). Há alguns anos (pouco antes do Windows 7), eu encontrava mais notebooks sendo vendidos com linux.
Oi Joao Felipe, interessantíssima esta sua visão.
Mas então se vende tanto, se há tanta publicidade, por que as app stores tanto do Windows Phone quanto do Windows 8 por que na sua opinião continuam sendo este deserto?
(Kico, antes do mais, tentei clicar no “Reply”, e aparece um dialog com “The page at http://www.itexto.net says: ERROR:
Can’t find the ‘commentformid’ div. [OK]” :S )
ReactOS é mesmo um projecto excelente – basearam-se no código do Wine para desenvolverem um sistema operativo de raiz, e foi a primeira versão de um sistema operativo compatível com Windows que rodei como live-cd (isto foi há cerca de 10 anos! :D ) – em http://reactos.org ainda vês alguma actividade lá, acho que ultimamente tem se focado no suporte usb, ntfs e estas coisas (vi algures que acho que até querem implementar ext2/3/4, zfs, suporte a outras arquitecturas como Arm (como RaspberryPi), etc., mas ainda não vi nada desenvolvido, testado e documentado…) – e da mesma forma que há actividade no desenvolvimento do ReactOS, também vemos no ArOS (baseado no AmigaOS) e no HaikuOS (baseado no BeOS).
O problema da Microsoft ao meu ver foi a perda de identidade. Por trás destas grandes empresas é investido uma fortuna no estudo de tendências de mercado e acredito que a microsoft tenha perdido o rumo nessa onda toda. A Apple conquistou o coração das pessoas pelo design + inovação. Eles fazem você sair da loja deles com aquela caixa branca do iPad como se tivesse saindo com seu bebê da maternidade. É o milagre divino. Agora você também tem o iPad. Comemore!
A Apple inovou nos anos 90 ao abraçar o mp3 com o iPod. Viu ali uma oportunidade de mercado que ninguém enxergava enquanto a mídia e os pop-stars alarmavam um futuro apocalíptico para a indústria fonográfica. Estavam errados e, bem ou mal, a companhia de Jobs havia marcado seu primeiro gol. A indústria se reinventou, contrariando às previsões pessimistas de outrora. A semente havia sido plantada.
Com a chegada do iPhone e, posteriormente, o iPad, a Apple permaneceu impondo o “padrão de qualidade + design” na indústria que veio copiando (diria até mesmo que involuntariamente) o formato de seus Gadgets. Algo similar ao que aconteceu com os Beatles na primeira metade dos anos 60: Até existiam bandas excelentes e fazendo coisas muito boas na Inglaterra e no resto do mundo, mas aos olhos do público tudo soava como cópia dos Beatles.
Do outro lado você tinha o Google revolucionando a web e a forma de se trabalhar, de consumir software, serviços e produtos. Vieram o Google Webmail (Outlook Killer), o Google Docs (Excel Killer) e o resto vc já conhece…
Onde a Microsoft se posicionou no meio disso tudo? Em lugar nenhum. Enquanto a Apple e o Google vinham ditando as regras do novo século, cada um com suas identidades muito bem definidas (A Apple como inovadora, tinha na imagem simples de Steve Jobs o perfil do profissional moderno, que usa calça jeans e All Star; enquanto o Google falava ao consumidor comum e às massas, portando versões do seu Android em celulares de qualquer fabricante), a Microsoft permaneceu no modelo industrial dos anos 90 e acabou perdendo de vez a nova geração de consumidores. Esta grande massa de consumo da qual falo são os meninos e meninas que não fazem menor idéia do que foi o Windows 95, não tem nenhum laço afetivo com a empresa de Uncle Bill. Com seus 16, 17 anos, esse é um público ávido por mobilidade que não faz a menor idéia da importância que a empresa de Redmond teve na vida das pessoas da geração anterior. É uma pena, realmente. Mas é o preço a se pagar pelo silêncio.
Isso sem falar no lado do programador e das tecnologias que surgem e somem, como Silverlight, Link to Sql, VBA, VBScript (tudo o que você já citou anteriormente).
Para concluir, queria dizer que também tenho um X-Box com Kinect que me diverte muito e torço para que a Microsoft dê a volta por cima. Mas são atitudes com as que vimos no lançamento do X-Box One que fazem esse caminho para a vitória se tornar cada vez mais distante.
Parabéns pelo post, Kico! Muito legal ter levantado essa questão!! Abraços!
Oi Carlos, obrigado!
Oi Kico, vc não está só…
Creio que devido a Microsoft ter um nicho empresarial muito grande (licenças de servidores, nuvem, office, email), acabou deixando um pouco o foco do consumidor pessoa física, que frequentemente tinha um produto seu pirata, mas usava, gostava e influenciava em seu trabalho a compra…
A verdade é que a Microsoft quando não produzia, acabava comprando os concorrentes e incorporando suas tecnologias… A Microsoft dormiu quando a net acelerou e dormiu de novo quando os smartfones explodiram… e a Nokia está indo pelo mesmo caminho… faz pouco tempo eu queria comprar um cel e o Nokia sempre foi o melhor harware, mas como iam descontinuar o sybiam e acabei optando por um galaxy s2 e putz, que escolha boa, fiquei impressionado com a máquina e o sistema com muiiiitos aplicativos bons gratis. Recentemente meu s2 sofreu um mergulho e precisei comprar outro cel e eu só tinha olhos para o Nokia 920/925 e a tal da PureView e Carl zeiss, masssssss ao comparar todas as demais tecnologias x Preço, comprei um Galaxy S4 mesmo e estou mais impressionado ainda… então a Nokia perdeu um comprador, porque não lançou um cel com android ou windows anos atrás e está com um produto muito caro hoje e eu conheci o android e tomei raiva do velho windows ce.
Creio que a medida que esta geração comece a ocupar postos de trabalho de decisão em suas empresas, provavelmente não decidirão mais por produtos microsoft, pois os concorrentes free estão chegando à altura e a medida que notebooks passem a executar sistemas operacionais em nuvem ou um evoluido Android 10.1 substituindo seu pai Linux, talvez em rom e redes sem fio para todo lado, veremos o fim da era Windows e a Microsoft deve acabar em menos de 20 anos… talvez 10…
A menos que… (o que acho que ela deveria fazer hoje pra sobreviver.: :-))
– Tornar o Windows 8 para cel free e continuar investindo nele como se não fosse.
– Lançar um Ultra Surface (para concorrer com os ultrabooks), mas com Windows 8 e nao RT.
– Baixar o preço do Windows / Office para pessoa Física a menos de us$30 ou grátis.
– Fazer a m* do Internet Explorer compativel com HTML padrão.. argggggggg
– E um Visual Studio para Grails :-)
[]’s Everton
ps. Claro que eu gostaria de um smartfone core I7 com capacidade para rodar call of duty e com windows 8…
Um Visual Studio pra Grails seria bom hein? :D
Matéria relacionada que pode achar interessante. http://www.infoworld.com/slideshow/116735/11-things-microsoft-actually-doing-right-225654#slide10
Acabei de ler isto. Muito boa.
E também uma outra na mesma Infoworld: “Why .net Failed” – http://www.infoworld.com/d/application-development/why-microsoft-net-failed-225817
Interessante sua visão, não é a única e muito menos desapercebida. Acredito que o fato da Microsoft ter liberado o IDE “Visual Studio 2012” (para Windows forms, web e mobile) inteiramente GRÁTIS ja é uma estratégia. Pensaste nisso? Abraço.
Bem observado.
Na realidade, foi o que a Apple fez em 1996/(ou algum ano entre 96 e 99) quando o Mac OS estava sendo dado como morto e o Steve Jobs voltou.
O primeiro passo foi liberar gratuitamente o XCode. Resultado: salvaram a pátria.