Hernán Cortés e o Software Livre

Hernán Cortés: sempre aprontando das suas...

A questão da conquista da América pelos espanhóis me fascina. Infelizmente, quanto mais leio a respeito mais me identifico com os nativos.

Estou lendo “A Conquista da América – A questão do outro”, de Tzvetan Todorov. Seu foco é a formação da imagem do nativo americano aos olhos dos conquistadores espanhóis. E num capítulo chamado “Compreender, Tomar e Destruir” tenta-se responder a seguinte questão: se os astecas eram a fonte de tanta riqueza para os espanhóis, o que os motivaria a aniquilar tão violentamente esta galinha dos ovos de ouro?

Foi quando um golpe sob a forma de frase me derrubou:

“(…) se a compreensão não for acompanhada de um reconhecimento pleno do outro como sujeito, então essa compreensão corre o risco de ser utilizada com vistas à exploração, ao “tomar”; o saber será subordinado ao poder.(…)”

É lindo quando alguém consegue colocar em palavras uma intuição que sempre tive.

Livro massa!

Conquistando o Software Livre

O trecho que citei acima pode ser aplicado a qualquer relação de exploração e acredito que se aplique bem na questão do software livre. Posso falar a respeito: afinal de contas não conheço muitos brasileiros que, assim como eu, invistam até financeiramente nesta idéia.

Com o tempo algo foi se tornando claro sobre uma fatia enorme dos usuários de software livre (especialmente desenvolvedores): sim, as pessoas compreendem seu valor e  o usam para gerar riqueza. O problema é que não reconhecem o fato de ser fruto do trabalho de outra(s) pessoa(s).

Alguns exemplos: fulanos  que postam alguma dúvida no Grails Brasil e me contactam por mensagem instantânea imediatamente exigindo que eu lhes responda. Outro? E-mails demandando que eu forneça um patch o mais rápido possível para algum projeto antigo de código aberto, como por exemplo o Miocc ou ODF Easy. Entenda: não tenho nada contra quem apenas usa software livre, mas odeio quem abusa de seus autores ou das pessoas que realmente participam do seu progresso.

Já ouvi muito o argumento de que o simples fato de estar usando o software já é uma forma de apoio. Na boa? Papo furado. Este argumento cai na contradição que expus no meu post anterior. Você está ajudando software livre com publicidade quando fomenta a comunidade, não como quem apenas demanda sem oferecer nada em troca.

Aniquilando o software livre

O massacre do software livre

É importante conhecer a diferença entre a destruição e aniquilamento. Na destruição deformamos algo de forma brusca e contra a sua vontade. Já o aniquilamento implica na remoção da razão da existência do objeto. Vou ser profético: acredito que estamos caminhando para o aniquilamento do software livre.

As pessoas produzem software livre visando reconhecimento que servirá para gerar algum lucro indireto através de consultorias, treinamentos, customizações ou mesmo obtenção de emprego em algum lugar devido à sua expertise. Conforme o abuso aumenta, torna-se economicamente inviável a contribuição para estes projetos, ou seja, aniquila-se o software livre.

Então como eu ajudo o software livre?

Neste caso, acredito que o processo deve ser iniciado a partir da seguinte pergunta: supondo que eu fosse o sujeito que desenvolve este software (que está inclusive me gerando algum retorno financeiro), como eu gostaria de ser ajudado?

Outra pergunta legal: “estou abusando?”. A resposta é fácil: se você demanda sem oferecer nada em troca, sim: você está abusando.

Ajudar portanto é simples: dê algo em troca. Pode ser qualquer coisa, desde que contribua. Participa de um fórum? Que tal buscar responder algumas perguntas ao invés de só buscar salvar o próprio rabo? Achou um bug? Não quer dizer que deva solucioná-lo imediatamente, pois muitas vezes não possuímos conhecimento técnico para tal, mas que tal apenas reportar o bug? Aliás, da pra ir um pouco além: que tal além de reportar o bug, também o divulgar para ver se alguém consegue resolver o problema?

Concluindo

O grande problema do software livre é a ilusão de que trata-se de um bem gratuito. Não existe grátis: tudo é feito visando algo em troca. O mínimo que devemos fazer é reconhecer este fato e ajudar quem está nos ajudando.

7 comentários em “Hernán Cortés e o Software Livre”

  1. Caro Henrique,

    Ótimo post! Continue sempre assim! Creio que um percentual gigantesco de “profissionais” de TI são como o Cortês, usam, abusam e não contribuem com o software que estão utilizando. Alguns pontos eu gostaria de questionar. Primeiramente utilizar um software é uma forma de contribuir com o mesmo. É assim que surgem as comunidades afinal não?Alguns desenvolvedores começam a usar, gostam e contribuem.. outros gostam e não fazem nada. Quanto maior a visibillidade de um software, maior a chance de ele receber contribuidores. Com relação à “matar” o software livre, achei um pouco apocalíptico. Existem vários modelos econômicos em torno do software livre e do software opensource. Veja: http://www.b-eye-network.com/view/2752. Terceiro: se você fez um software e o disponibilizou mesmo que “sem cobrar nada”, isso não é pretexto pra não dar ajuda, suporte, corrigir etc. Qualidade não tem relação direta com o tipo de licenciamento que o software carrega. Por outro lado, uma pessoa que usa o software opensource pode corrigir o problema ou bug e mandar a contribuição para o desenvolvedor ao invés de infernizar a vida e não contribuir não chega a ser abuso. Quem faz um software opensource faz porque o quer, e não deve esperar nada em troca.

    1. Oi Mr Leo. Que bom que gostou.

      Concordo com diversos dos seus pontos: como disse, não tenho absolutamente nada contra quem simplesmente usa, mas sim contra quem abusa.

      É interessante o seu ponto: a pergunta que talvez caiba é a seguinte: o que vêm a ser a comunidade de fato? Será que podemos chamar uma pessoa membro da comunidade por usar algo isoladamente? (novamente, nada contra o uso isolado desde que não gere abuso). Comunidades surgem não só quando as pessoas usam, mas sim quando elas trocam informações entre si a respeito de um produto, seja ele qual for. Este acredito que seja O grande ponto.

      Yeap, existem vários modelos econômicos baseados no software livre. O problema é que o trabalho DE FATO, é normalmente produzido por desenvolvedores individuais. A partir do momento em que o abuso aumenta (e tem aumentado demais), me pergunto o que motivaria alguém a contribuir mais com este padrão de negócio.

      (eu mesmo ia liberar o código fonte do Grails Brasil: estou tão decepcionado que simplesmente desisti da idéia)

      No entanto discordo com relação ao ponto qualidade. No meu texto eu não digo que a qualidade do software seja relacionada ao modelo aplicado.

      Discordo também com relação ao último ponto: não existe isto de fazer qualquer coisa sem esperar nada em troca. O simples fato de estar sendo disponibilizado já demonstra o interesse por reconhecimendo pelo autor. Se não houvesse este interesse, sequer publicado seria.

      Flow!

  2. Muito bom Henrique!

    Suas opiniões sempre nos fazem refletir sobre aspectos que por vezes deixamos esquecidos, ignorados.

    Concordo com a existência de um grande número de indivíduos que tendem a abusar daqueles que se empenham no desenvolvimento e divulgação do Software Livre, sem oferecer nada em troca. Normalmente são os mesmos que nas coxias de seu trabalho falam mal daquilo que conseguiram sem derramar uma gota de suor.

    Mas é fato que o Software Livre ganhou espaço e, no mínimo, saiu da sua condição marginal. Ainda não estamos nem longe do ideal, mas já serve como alento.

    Acho importantíssima a participação de desenvolvedores em fóruns e demais listas de discussão; principalmente para aqueles mais experientes, que podem servir de guia para os iniciantes – como você tem feito no grailsbrasil. Entretanto inúmeras vezes vejo quem tem mais conhecimento inibir a participação de programadores bisonhos, sem dar uma direção a eles. Não digo com isso para entregarmos o trabalho pronto, e sim orientar.

    Quanto ao apocalíptico fim do Software Livre, imagino que em um futuro próximo isso não ocorra, mas talvez sofra uma mudança, como algo condicionado à colaboração no aprimoramento do software para a liberdade de uso do mesmo.

  3. Olá Kiko. Achei interessante o post. Seu site é muito informativo porém não possui links para compartilhar no twitter, facebook, google plus e etc. Agora mesmo tentei fazer isso mas não encontrei links no post. Valeu pelas dicas.

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    Best regards,
    Satomi Joba

  5. Algumas empresas precisam resolver dependencias para vender seus produtos. Se essas empresas se unirem para apoiar projetos de software livre, essas dependencias poderão ser satisfeitas. O problema é que não existe uma forma eficiente de comunicação e comparação de dependencias entre as empresas para que se levante os requisitos e se estabelecam parcerias de apoio ao software livre. Note que depois que a M$ começou a participar do desenvolvimento do Linux, e acredito que a qualidade do Linux vai cair porque eles querem vender o WIndows. Existem algumas ações que não fazem sentido.

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